Inadimplentes são excluidos do REFIS

Mais de 70% das empresas que aderiram ao Programa de Recuperação Fiscal (Refis) foram excluídas pelo governo - a maioria por inadimplência. De acordo com a Receita Federal, das 129.085 companhias que parcelaram suas dívidas tributárias e previdenciárias sobraram apenas 36.945, o equivalente a 28,6% do total inicial. A falta de pagamento das parcelas das dívidas consolidadas pelo programa ou a falta de regularidade no recolhimento de tributos foram os principais motivos apresentados para justificar a expulsão de 84.192 empresas. Outras 7.948 tiveram os termos de adesão indeferidos.

Apesar desses números, o governo rejeita a idéia de que o programa tenha fracassado na tentativa de aumentar sua arrecadação e possibilitar que empresas inadimplentes voltem à normalidade. O coordenador-geral da dívida ativa da União, Agostinho Netto, destaca que a receita obtida com o Refis foi de R$ 3,5 bilhões em dois anos e quatro meses. Mesmo com o número reduzido de participantes, a previsão para este ano é de arrecadar cerca de R$ 2 bilhões, ante R$ 1,8 bilhão em 2001. "Não há fracasso", diz Netto, que representa a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional no Comitê Gestor do Refis.

Segundo ele, as empresas que permanecem no Refis são responsáveis por quase 80% do total das dívidas consolidadas pelo programa, cujo valor inicial era de R$ 150 bilhões. Isso corresponde a R$ 120 bilhões em débitos e sinaliza que as empresas de menor porte foram as que tiveram maior dificuldade em se manter no Refis.

Mas os empresários têm uma visão diferente da situação. O diretor do Departamento de Competitividade da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Mário Bernardini, observa que o Refis foi saudado como uma solução inteligente para equacionar o problema de uma dívida que era incobrável, já que quebraria boa parte das empresas. No entanto, os resultados foram considerados decepcionantes pelo diretor da Fiesp.

"O problema é que as empresas não estão conseguindo pagar os impostos correntes, e isso mostra claramente que tem alguma coisa de muito errado no sistema", diz Bernardini. Segundo ele, nos últimos anos o setor produtivo sofreu um aumento brutal da carga tributária e de custos, por causa das taxas de juros elevadas, enquanto o preço dos produtos ficou estabilizado ou até caiu. "Tal situação empurra muitas empresas para a informalidade e as pessoas, para a marginalidade."

Criado no final de 1999, o Refis permitiu que as empresas parcelassem suas dívidas com impostos e contribuições federais em suaves prestações a perder de vista. Elas pagam por mês um porcentual mínimo sobre seu faturamento, que vai de 0,3% a 1,5%, independentemente do tamanho da dívida. Em média, as empresas ganharam 50 anos para quitar seus débitos. Algumas, no entanto, tiveram 500 anos de prazo. Em troca, comprometeram-se a reconhecer os débitos de forma irretratável, desistindo de ações em curso na Justiça.

Agostinho Netto, da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, diz que, se essas dívidas não tivessem sido renegociadas, o governo não chegaria a ver a cor desse dinheiro. A grande vantagem, segundo ele, é que as empresas se comprometeram a não atrasar mais o pagamento dos tributos desde a data em que optaram pelo Refis. A falta de pagamento por três meses consecutivos ou seis intercalados pode levar à exclusão do programa.

O tributarista Fernando Lottenberg, que presta assessoria jurídica para a presidência da Fiesp, diz que "há uma grande má vontade, por parte da Receita Federal e do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em relação às empresas que optaram pelo Refis". Para ele, isso explicaria boa parte das exclusões. "Algumas empresas só ficam sabendo que foram excluídas quando o decreto é publicado pelo Diário Oficial", diz o advogado, ressaltando que os motivos da decisão nem sempre são divulgados.

Muitas empresas estão entrando na Justiça com mandado de segurança contra a sua exclusão do programa. Para muitas delas, essa medida pode significar o fim da linha. De acordo com o coordenador da dívida ativa da União, o débito das empresas que foram retiradas do programa será executado. As cobranças judiciais, que normalmente duram em média quatro anos, no caso do Refis devem durar apenas um ano.

"As exclusões foram motivadas basicamente por inadimplência. Elas deixaram de pagar por diversos motivos, inclusive porque não tinham condições. Muitas apostaram que não haveria como conferir os vencimentos e se deram mal", argumenta Agostinho Netto. Há casos, em menor escala, de tentativas de fraudes por parte de empresas que fazem cisão ou fusão, mudando a razão social ou transferindo faturamento para outra empresa.

Para os funcionários da Receita Federal, o Refis não passa de uma anistia fiscal mal disfarçada. "O pior é que não separa o joio do trigo. Ou seja, não distingue quem ficou inadimplente por mera incapacidade de quitar as dívidas dos sonegadores", afirma a vice-presidente do Unafisco Sindical, Fátima Gondim. No rol de beneficiários do programa, segundo ela, estão empresas que financiaram seu negócio com dinheiro dos trabalhadores. São empresas que descontam dos salários de seus empregados as contribuições sociais e o Imposto de Renda na fonte, mas não recolhem os valores aos cofres públicos.

Marcelo Rehder

Fonte: O Estado de São Paulo - On Line